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quinta-feira, 19 de março de 2020

OMOLU

Omolu é a divindade associada à peste e à cura no sistema espiritual yorubá. Omolu é um velho que é saudado com silêncio e austeridade. Todos os Orixás respeitam e todas as pessoas temem sua força.
Este Orixá rege a relação da vida e da morte. Nós como sociedade temos muito o que matar. Nossa relação adoecida com as estruturas sociais, nossa relação com a produção desenfreada, com o consumo, com os mais velhos, com as crianças, com o trabalho, com a coletividade. São tantas chagas a curar que quando me dei conta da gravidade do que estamos enfrentando em tempo de coronavírus só consegui pensar no poder de cura sistêmica representada por Omolu.
Estamos sendo obrigados a brincar com as crianças que trancamos em escolas integrais, a nos preocupar com os mais velhos que trancamos em asilos, a repensar e mudar nossa relação com trabalho priorizando a vida, a parar de consumir desesperadamente, a pensar pela primeira vez desde que o capitalismo se tornou o que é, em renda básica para os mais pobres, a priorizar os mais vulneráveis, a fazer sacrifícios pelo bem do todo. Esse é um poder que só Omolu tem. A perspectiva da morte muda tudo dentro de nós. E ela requer recolhimento, silêncio... Ela requer de nós coisas que não conhecemos, que ficam ocultas debaixo das palhas. A peste não pode nos ver quando nos recolhemos sob as palhas de Omolu.
Assim como no itan que conta a história de Omolu, quando as palhas enfim voarem, na hora certa poderemos ver a cura, a saúde, e a felicidade porque fizemos o sacrifício adequado do silêncio e do recolhimento, matando as coisas que nos adoeciam. Aí então poderemos ver Obaluaê, sua face jovem e resplandecente que transforma chagas em pérolas. Que Omolu varra com seu xaxará toda desgraça e doença do nosso corpo social. E que possamos assumir a grande missão de varrer de nossa sociedade tudo aquilo que já deveria ter sido expulso há muito tempo... A desigualdade, a indiferença, a arrogância, a falta de compreensão holística. Que seu poder cure nosso olhar pra vida, nos fazendo renovar nossos valores e nos comprometer com o que é verdadeiramente importante.
Atotô, meu velho!
Mariah Morena

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